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sexta-feira, 8 de novembro de 2013

::: Mesa de discussões ::: Dia 3 :::




Começamos a conversa do domingo, dia 3, analisando a coreografia “Forrobodó”, do Grupo Bailah.

Interessante como o grupo utilizou do “jogo” e da “brincadeira” para levar ao palco a dança de salão, dança em que importa mais o prazer espiralado do jogo do que um significado para cada passo. Por conta desses elementos levados para a cena, a coreografia criou um contexto para sua dança com variações de desenhos e de fluxo que potencializam a comunicação com a plateia. Sugiro ao Grupo Bailah que aperfeiçoe a assimilação das técnicas de dança de salão que lhe interessam, para que esteja presente no corpo dos dançarinos desde em corridas, brincadeiras, encenações até nos movimentos em conjunto.

"Forrobodó" do Grupo Baila. Foto: Aurélio Vinícius.

Logo em seguida, observamos comparativamente duas coreografias: “Roda de salsa”, do Grupo Bailah, e “Yoake”, do Grupo Seishun. Mayara Martins, diretora da academia de mesmo nome, sediada em Aquidauana, enfatizou, ao longo da conversa, o quanto a coreografia lhe chamou atenção e como não conseguia colocar em palavras os motivos de seu entusiasmo. Expressou-se em gestos: “começou assim”, disse pressionando uma mão contra a outra, “e finalizou assim”, disse abrindo os braços.

Houve um crescente de intensidade em “Yoake”, que significa “alvorada”, em japonês. Como a imagem da palavra sugere, a coreografia foi crescendo gradativamente de intensidade, desde a música, à quantidade de dançarinos em cena, de elementos cênicos – bandeiras, leques, lenços coloridos –, troca de figurinos, de saltos, e de gritos que intensificavam a pulsação da música. Além disso, a composição coreográfica foi enriquecida ao apresentar conjuntos heterogêneos, em que parte dos dançarinos pontuava pausas para baixo, enquanto outros pontuavam para cima.

"Yoake", do Grupo Seishun. Foto: Aurélio Vinícius.

Diferente de “Yoake”, “Roda de salsa” apresentou fluxo contínuo em sua composição. Começou e terminou com o mesmo desenho coreográfico – uma roda no centro do palco – e a cada repetição dos movimentos dos dançarinos era acrescentado um novo passo. Marcelo Victor da Rosa, diretor do Grupo Bailah, explicou que essa é uma dança tradicional, de domínio público, por isso não pôde ser alterada. Por esse motivo, acredito que poderiam ser estudadas maneiras de se diferentes de se dispor espacialmente essa dança já codificada: se fossem dispostas no palco duas rodas movendo-se simultaneamente, por exemplo, ou se uma estivesse alguns minutos mais avançada do que a outra, já seria criada uma composição heterogênea, que manteria a atenção do público por mais tempo.



O gesto antes da dança, a dança antes do gesto

Diversos participantes da conversa expuseram suas observações sobre o espetáculo “Versos da última estação”, apresentado por Vanessa Macedo, na abertura da noite de sábado.

Chamou-lhes a atenção o fato de Vanessa iniciar sua dança de costas para a plateia, sentada, sem se mover. O que movia era uma luz à sua frente e de frente para a plateia, que acendia e apagava. A outros, chamou a atenção o fato de em seus movimentos haver uma resistência: eram gerados a partir da pressão contra o chão, por exemplo. 

A dança da Vanessa não pressupõe um “gesto” antes de ela existir. Como a própria artista explicou, logo depois de sua apresentação, durante bate-papo com a plateia, o espetáculo nasceu de inquietações suas que se tornaram movimentos ao longo da criação e que, apesar de não serem “passos”, se repetem a cada apresentação, pois foram “coreografados”.

Já a dança apresentada pelo Grupo Maktub, por exemplo, o solo da princesa Aurora, trecho do espetáculo “A bela adormecida”, coreografada por Marius Petipa (1818-1910), composta por Tchaikovski (1840-1893), pressupõe gestos antes de ser encenada. Tornou-se repertório da dança disseminado em praticamente todos os países do mundo, portanto, antes do Grupo Maktub estrear, o solo já existia, os gestos já existiam e os passos organizados pela técnica do balé também. Dessa maneira, a questão coreográfica do Grupo Maktub torna-se distinta da de Vanessa Macedo, por exemplo. Uma das questões são os processos de assimilação desses gestos e dessa técnica para o contexto daquele corpo presente. 
"Aurora", apresentada pelo Grupo Maktub. Foto: Aurélio Vinícius.




Bailarino e artista: a mesma coisa ou coisas diferentes?

Ao longo da conversa uma dualidade emergiu: bailarino e artista foram consideradas instâncias separadas. Por quê?

Foi atribuído ao artista a ação de criar, de ter certo domínio sobre a obra. Ao bailarino, foi atribuído o papel de executar os comandos do criador. Nessa conversa toda, surgiu uma metáfora importante de ser analisada: a do corpo como folha de papel em branco.

Quando se trata de corpo não é possível utilizar a metáfora do papel em branco, da tábula rasa ou da madeira em estado bruto que será talhada. Porque antes de receber qualquer comando, o corpo já é um monte de coisa, um sistema complexo de diversas informações, umas mais estabilizadas que outras, que implicam tanto no modo de conectar ideias verbalmente, como na maneira de sentar, de levantar, de abrir os braços, de posicionar a coluna cervical. Tais afirmações estão baseadas em uma teoria chamada Corpomídia (2005), desenvolvida pelas pesquisadoras Helena Katz e Christine Greiner, que estudam corpo, dança e comunicação há mais de 20 anos.

Além disso, pela etimologia da palavra “intérprete”, que descende do romano interpres, que significa tradutor (1989), dá pistas para se compreender que em vez de passivo, o intérprete é ativo ao traduzir em seu corpo os comandos de um coreógrafo e diretor.



Análises breves

A coreografia “Brilhar”, da academia Brício Dance, tinha como elemento compositivo o acompanhamento da música pelos movimentos. Foram realizados desenhos com linhas retas, mantendo a frontalidade com a plateia. A coreografia “Um segredo”, da academia Mayara Martins, lançou mão de sincronias, dessincronias e canons. 


"Um segredo", da academia Mayara Martins. Foto: Aurélio Vinícius.

O Ballet Isadora Duncan apresentou “Celebração à vida”, cujos movimentos eram gerados de acordo com a pulsação da música. Havia recursos como canons e o espaço era preenchido em linhas retas.

O Grupo Expressão de Rua apresentou “D3” cuja composição criava espaços e tempos e desfazia-os rapidamente. “Big bang”, do Grupo Simbiose, criou uma dança de desfrute, que seguia a pulsação da música.



Referências de pesquisa:

GREINER, C. e KATZ, H. 2005 “Por uma teoria do Corpomídia”, in GREINER, C. O corpo, São Paulo, Annablume, pp. 125-133.

KATZ, H. 1989 “O claro enigma da tradução”, in HOGHE, R. e WEISS, U. (org.), Bandoneon: em que o tango pode ser bom para tudo?, São Paulo, Attar, pp. 9-10.

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